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Durante séculos falou-se de uma misteriosa estátua de um cavaleiro apontando para Oeste, na [[Ilha do Corvo]], como prova da presença de antigos e ignorados navegadores. ("''Saudades da Terra"'', [[Gaspar Frutuoso]], Vol. 6.) Para os seus detractores, a estátua equestre nunca terá existido. A lenda foi citada por historiadores renascentistas como um facto verídico. O relato da Estátua equestre é considerado como um rochedo sugestivo ou pura invenção, com o intuito de valorizar a ilha e aguçar a curiosidade pelas terras a Ocidente. Contudo, é uma crença quase tão antiga como a colonização da ilha e faz parte do seu folclore local. Os arqueólogos não descobriram, até ao momento, nos Açores, quaisquer vestígios ou provas conclusivas quanto a uma presença de fenícios ou cartagineses.
   
 
É o historiador Damião de Góis (1502-1574), na "Crónica do Sereníssimo Príncipe Dom João", que nos diz que, quando os portugueses chegaram a essa remota ilha, encontraram uma estátua equestre no cume noroeste da serra no centro da ilha, colocada sobre um pedestal quadrado. Construída a partir de um único bloco de pedra, a estátua representava um cavaleiro com a sua montada e coberto por um manto e com a cabeça descoberta. Com a mão esquerda segurava as crinas do cavalo e apontava com o direito para Ocidente.
Durante séculos se falou de uma misteriosa estátua de um cavaleiro apontando para Oeste, na [[Ilha do Corvo]], como prova da presença de antigos e ignorados navegadores. (''Saudades da Terra'', [[Gaspar Frutuoso]], Vol. 6.) Para os seus críticos, a estátua equestre nunca terá existido. A lenda foi citada por historiadores renascentistas como um fato verídico. O relato da Estátua equestre é considerado como um rochedo sugestivo ou pura invenção, com intuito de valorizar a ilha e instigar a curiosidade pelas terras a Ocidente. Contudo, é uma crença quase tão antiga quanto a colonização da ilha e faz parte do seu folclore local. Os arqueológos não descobriram até ao momento nos Açores de quaisquer vestígios ou provas conclusivas quanto a uma presença de fenícios ou cartagineses.
 
   
 
«D. Manuel I teria mandado a [[Duarte d´Armas]] que fizesse um desenho da estátua e ordenado o seu transporte para Lisboa, mas o Rei só viria a receber pedaços do monumento, nomeadamente, a cabeça e o braço e mão direitas, assim como parte do cavalo. Estas peças teriam sido guardadas no Palácio Real, tendo-se perdido o seu rasto a partir daqui. Na base - deixada na ilha - existiriam algumas letras numa escrita desconhecida, que foram copiadas em [[1529]] por [[Pedro da Fonseca]], [ Capitão-do-Donatário das ilhas das Flores e Corvo ], mas cujo teor ninguém conseguiu até hoje identificar».
É o historiador Damião de Góis (1502-1574), na "Crónica do Sereníssimo Príncipe Dom João", que nos diz que quando os portugueses chegaram a essa remota ilha encontraram uma estátua equestre no cume noroeste da serra no centro da ilha, colocada sobre um pedestal quadrado. Construída a partir de um único bloco de pedra, a estátua representava um cavaleiro com a sua montada e coberto por um manto e com a cabeça descoberta. Com a mão esquerda segurava as crinas do cavalo e apontava com o direito para Ocidente."
 
 
"D. Manuel I teria mandado a [[Duarte d´Armas]] que fizesse um desenho da estátua e ordenado o seu transporte para Lisboa, mas o Rei só viria a receber pedaços do monumento, nomeadamente, a cabeça, e o braço e mão direitas, assim como parte do cavalo. Estas peças teriam sido guardadas no Palácio Real, tendo-se perdido o seu rasto a partir daqui. Na base - deixada na ilha - existiriam algumas letras numa escrita desconhecida que foram copiadas em [[1529]] por [[Pedro da Fonseca]], [ Capitão-do-Donatário das ilhas das Flores e Corvo ], "mas cujo teor ninguém conseguiu até hoje identificar".
 
   
 
Os historiadores açorianos, Gaspar Frutuoso ([[1522]]-[[1591]]) e [[António Cordeiro]] ([[1641]]-[[1722]]), classificaram a história da estátua ao nível duma "antiguidade muito notável".
 
Os historiadores açorianos, Gaspar Frutuoso ([[1522]]-[[1591]]) e [[António Cordeiro]] ([[1641]]-[[1722]]), classificaram a história da estátua ao nível duma "antiguidade muito notável".
   
[[Diogo das Chagas]] ([[1575]]-[[1667]]), historiador açoriano cujo irmão foi Pároco do Corvo, não lhe faz a mínima referência. Os ingleses Joseph e Henry Bullar escreveram e publicaram um livro relatando, meticulosamente, a sua estadia nos Açores (de Dezembro [[1838]] a Maio [[1839]]). Na sua descrição da Ilha do Corvo, não se encontra qualquer referência da dita estátua equestre. O escritor Raul Brandão (1867-1930), que esteve no Corvo entre 17 a 30 de Junho de [[1924]], não fez menção da dita estátua no seu livro ''As Ilhas Desconhecidas''.
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[[Diogo das Chagas]] ([[1575]]-[[1667]]), historiador açoriano, cujo irmão foi Pároco do Corvo, não lhe faz a mínima referência. Os ingleses Joseph e Henry Bullar escreveram e publicaram um livro relatando, meticulosamente, a sua estadia nos Açores (de Dezembro [[1838]] a Maio [[1839]]). Na sua descrição da Ilha do Corvo, não se encontra qualquer referência da dita estátua equestre. O escritor Raul Brandão (1867-1930), que esteve no Corvo entre 17 a 30 de Junho de [[1924]], não lhe fez menção no seu livro "''As Ilhas Desconhecidas"''.
   
O Tenente-coronel José Agostinho (1888-1978), após a sua missão arqueológica no Corvo no Verão de [[1945]], declarou que "a estátua náo foi feita pela mão do homem; um simples bloco de basalto que tomou aquela forma por acidente." Estas e outras observações foram publicadas na revista ''Açoreana'', onde somos ainda elucidados que os corvinos "nunca viram nem ouviram falar de edificações arruinadas." (Vol. 4, Angra do Heroísmo, 1946)
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O Tenente-coronel José Agostinho (1888-1978), após a sua missão arqueológica no Corvo no Verão de [[1945]], declarou que «a estátua não foi feita pela mão do homem; um simples bloco de basalto que tomou aquela forma por acidente.» Estas e outras observações foram publicadas na revista ''Açoreana'', onde somos ainda elucidados que os corvinos «nunca viram, nem ouviram falar de edificações arruinadas.» (Vol. 4, Angra do Heroísmo, 1946)
   
Em Novembro de [[1749]], quando foram achadas na ilha várias moedas alegadamente fenícias ou cartaginesas, os defensores da tese da existência da Estátua Equestre rejubilaram. Se havia moedas, a lógica era que "estiveram fenícios no Corvo". Não há razões para duvidar da veracidade desse achado, nem da autenticidade dessas moedas de ouro e cobre. Mas isso por si não prova que estiveram fenícios nas ilhas do Grupo Ocidental açoriano. O achado, a ter-se verificado, teve por certo outra origem, bem mais moderna e também mais fácil de sustentar.
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Em Novembro de [[1749]], quando foram achadas na ilha várias moedas alegadamente fenícias ou cartaginesas, os defensores da tese da existência da Estátua Equestre rejubilaram. Se havia moedas, a lógica era de que "estiveram fenícios no Corvo". Não há razões para duvidar da veracidade desse achado, nem da autenticidade dessas moedas de ouro e cobre. Mas isso, por si só, não prova que estiveram fenícios nas ilhas do Grupo Ocidental açoriano. O achado, a ter-se verificado, teve por certo outra origem, bem mais moderna e também mais fácil de sustentar.
   
Em [[1761]], o numismata sueco Johann Frans Podolyn relatou o seguinte: "No mês de Novembro de 1749, após alguns dias de ventos tempestuosos de oeste, que puseram a descoberto parte dos alicerces de um edifício em ruínas na costa da Ilha do Corvo, apareceu uma vasilha de barro negro, quebrada que continha um grande número de moedas, as quais, juntamente com a vasilha, foram levadas a um convento" [ que seria o Convento de São Boaventura, na vila de [[Santa Cruz das Flores]] ], "onde as moedas foram repartidas por pessoas curiosas residentes na ilha. Algumas dessas moedas foram enviadas para Lisboa e dali mais tarde remetidas ao Pe. Enrique Flórez, em Madrid. O número de moedas contidas na vasilha não se conhece e nem quantas foram mandadas de Lisboa, mas a Madrid chegaram 9 (nove) moedas. ... O padre Flórez fez-me presente destas moedas quando estive em Madrid em 1761, e disse-me que no todo do achado havia apenas moedas destas nove variedades." (''Achados Arqueológicos nos Açores'', José Agostinho, em ''Açoreana'', Vol. 4, fasc. 1, 1946, pág. 101-2 - O Pe. Enrique Flórez de Setién y Huidobro, (1701-1773), foi um conhecido historiador e numismata espanhol que pertenceu em vida à Ordem de Santo Agostinho.)
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Em [[1761]], o numismata sueco Johann Frans Podolyn relatou o seguinte: «No mês de Novembro de 1749, após alguns dias de ventos tempestuosos de oeste, que puseram a descoberto parte dos alicerces de um edifício em ruínas na costa da Ilha do Corvo, apareceu uma vasilha de barro negro, quebrada que continha um grande número de moedas, as quais, juntamente com a vasilha, foram levadas a um convento» [ que seria o Convento de São Boaventura, na vila de [[Santa Cruz das Flores]] ], «onde as moedas foram repartidas por pessoas curiosas residentes na ilha. Algumas dessas moedas foram enviadas para Lisboa e dali mais tarde remetidas ao Pe. Enrique Flórez, em Madrid. O número de moedas contidas na vasilha não se conhece e nem quantas foram mandadas de Lisboa, mas a Madrid chegaram 9 (nove) moedas. ... O padre Flórez fez-me presente destas moedas quando estive em Madrid em 1761, e disse-me que no todo do achado havia apenas moedas destas nove variedades.» (''Achados Arqueológicos nos Açores'', José Agostinho, em ''Açoreana'', Vol. 4, fasc. 1, 1946, pág. 101-2 - O Pe. Enrique Flórez de Setién y Huidobro, (1701-1773), foi um conhecido historiador e numismata espanhol que pertenceu em vida à Ordem de Santo Agostinho.)
   
 
Quanto à autenticidade das nove moedas encontradas, o geógrafo alemão Alexander von Humboldt afirmou não haver disso a menor dúvida, visto que os seus desenhos foram comparados com as moedas conservadas no gabinete do Príncipe da Dinamarca. ("Exame Crítico da Arqueologia do Novo Mundo" por Alexander von Humboldt, citado no ''Arquivo dos Açores'', [[Universidade dos Açores]], Ponta Delgada, 1981, Ed. fac. pela Ed. de 1881, Vol. 3, pág. 111-2) As gravuras dessas moedas foram publicadas, primeiramente, na revista sueca Memórias da Sociedade de Gotemburgo, e reproduzidas na ''Açoreana'', em 1946, e no ''Boletim do Instituto Histórico da Ilha Terceira'', em 1947.
 
Quanto à autenticidade das nove moedas encontradas, o geógrafo alemão Alexander von Humboldt afirmou não haver disso a menor dúvida, visto que os seus desenhos foram comparados com as moedas conservadas no gabinete do Príncipe da Dinamarca. ("Exame Crítico da Arqueologia do Novo Mundo" por Alexander von Humboldt, citado no ''Arquivo dos Açores'', [[Universidade dos Açores]], Ponta Delgada, 1981, Ed. fac. pela Ed. de 1881, Vol. 3, pág. 111-2) As gravuras dessas moedas foram publicadas, primeiramente, na revista sueca Memórias da Sociedade de Gotemburgo, e reproduzidas na ''Açoreana'', em 1946, e no ''Boletim do Instituto Histórico da Ilha Terceira'', em 1947.

Edição atual desde as 11h21min de 10 de setembro de 2018

Durante séculos falou-se de uma misteriosa estátua de um cavaleiro apontando para Oeste, na Ilha do Corvo, como prova da presença de antigos e ignorados navegadores. ("Saudades da Terra", Gaspar Frutuoso, Vol. 6.) Para os seus detractores, a estátua equestre nunca terá existido. A lenda foi citada por historiadores renascentistas como um facto verídico. O relato da Estátua equestre é considerado como um rochedo sugestivo ou pura invenção, com o intuito de valorizar a ilha e aguçar a curiosidade pelas terras a Ocidente. Contudo, é uma crença quase tão antiga como a colonização da ilha e faz parte do seu folclore local. Os arqueólogos não descobriram, até ao momento, nos Açores, quaisquer vestígios ou provas conclusivas quanto a uma presença de fenícios ou cartagineses.

É o historiador Damião de Góis (1502-1574), na "Crónica do Sereníssimo Príncipe Dom João", que nos diz que, quando os portugueses chegaram a essa remota ilha, encontraram uma estátua equestre no cume noroeste da serra no centro da ilha, colocada sobre um pedestal quadrado. Construída a partir de um único bloco de pedra, a estátua representava um cavaleiro com a sua montada e coberto por um manto e com a cabeça descoberta. Com a mão esquerda segurava as crinas do cavalo e apontava com o direito para Ocidente.

«D. Manuel I teria mandado a Duarte d´Armas que fizesse um desenho da estátua e ordenado o seu transporte para Lisboa, mas o Rei só viria a receber pedaços do monumento, nomeadamente, a cabeça e o braço e mão direitas, assim como parte do cavalo. Estas peças teriam sido guardadas no Palácio Real, tendo-se perdido o seu rasto a partir daqui. Na base - deixada na ilha - existiriam algumas letras numa escrita desconhecida, que foram copiadas em 1529 por Pedro da Fonseca, [ Capitão-do-Donatário das ilhas das Flores e Corvo ], mas cujo teor ninguém conseguiu até hoje identificar».

Os historiadores açorianos, Gaspar Frutuoso (1522-1591) e António Cordeiro (1641-1722), classificaram a história da estátua ao nível duma "antiguidade muito notável".

Diogo das Chagas (1575-1667), historiador açoriano, cujo irmão foi Pároco do Corvo, não lhe faz a mínima referência. Os ingleses Joseph e Henry Bullar escreveram e publicaram um livro relatando, meticulosamente, a sua estadia nos Açores (de Dezembro 1838 a Maio 1839). Na sua descrição da Ilha do Corvo, não se encontra qualquer referência da dita estátua equestre. O escritor Raul Brandão (1867-1930), que esteve no Corvo entre 17 a 30 de Junho de 1924, não lhe fez menção no seu livro "As Ilhas Desconhecidas".

O Tenente-coronel José Agostinho (1888-1978), após a sua missão arqueológica no Corvo no Verão de 1945, declarou que «a estátua não foi feita pela mão do homem; um simples bloco de basalto que tomou aquela forma por acidente.» Estas e outras observações foram publicadas na revista Açoreana, onde somos ainda elucidados que os corvinos «nunca viram, nem ouviram falar de edificações arruinadas.» (Vol. 4, Angra do Heroísmo, 1946)

Em Novembro de 1749, quando foram achadas na ilha várias moedas alegadamente fenícias ou cartaginesas, os defensores da tese da existência da Estátua Equestre rejubilaram. Se havia moedas, a lógica era de que "estiveram fenícios no Corvo". Não há razões para duvidar da veracidade desse achado, nem da autenticidade dessas moedas de ouro e cobre. Mas isso, por si só, não prova que estiveram fenícios nas ilhas do Grupo Ocidental açoriano. O achado, a ter-se verificado, teve por certo outra origem, bem mais moderna e também mais fácil de sustentar.

Em 1761, o numismata sueco Johann Frans Podolyn relatou o seguinte: «No mês de Novembro de 1749, após alguns dias de ventos tempestuosos de oeste, que puseram a descoberto parte dos alicerces de um edifício em ruínas na costa da Ilha do Corvo, apareceu uma vasilha de barro negro, quebrada que continha um grande número de moedas, as quais, juntamente com a vasilha, foram levadas a um convento» [ que seria o Convento de São Boaventura, na vila de Santa Cruz das Flores ], «onde as moedas foram repartidas por pessoas curiosas residentes na ilha. Algumas dessas moedas foram enviadas para Lisboa e dali mais tarde remetidas ao Pe. Enrique Flórez, em Madrid. O número de moedas contidas na vasilha não se conhece e nem quantas foram mandadas de Lisboa, mas a Madrid chegaram 9 (nove) moedas. ... O padre Flórez fez-me presente destas moedas quando estive em Madrid em 1761, e disse-me que no todo do achado havia apenas moedas destas nove variedades.» (Achados Arqueológicos nos Açores, José Agostinho, em Açoreana, Vol. 4, fasc. 1, 1946, pág. 101-2 - O Pe. Enrique Flórez de Setién y Huidobro, (1701-1773), foi um conhecido historiador e numismata espanhol que pertenceu em vida à Ordem de Santo Agostinho.)

Quanto à autenticidade das nove moedas encontradas, o geógrafo alemão Alexander von Humboldt afirmou não haver disso a menor dúvida, visto que os seus desenhos foram comparados com as moedas conservadas no gabinete do Príncipe da Dinamarca. ("Exame Crítico da Arqueologia do Novo Mundo" por Alexander von Humboldt, citado no Arquivo dos Açores, Universidade dos Açores, Ponta Delgada, 1981, Ed. fac. pela Ed. de 1881, Vol. 3, pág. 111-2) As gravuras dessas moedas foram publicadas, primeiramente, na revista sueca Memórias da Sociedade de Gotemburgo, e reproduzidas na Açoreana, em 1946, e no Boletim do Instituto Histórico da Ilha Terceira, em 1947.